domingo, 1 de maio de 2011

Manifesto sobre a alienação entre os homens modernos

       

       Antes de tudo, quero que você leitor, responda algumas questões: Possui algum cargo político onde representa outros cidadãos? É um grande empresário? É um ativista empenhado em alguma mudança social ou política? Já foi preso, perseguido, investigado ou agredido por participar de alguma forma de manifestação contra ou a favor de algo? Se não respondeu positivamente a nenhuma das questões, este texto também é para você.

       Lembro que quando eu era criança ficava intrigado ao ver meu pai assistir a todos os noticiários que podia, diversas vezes ao dia, em diferentes canais. Eu não gostava nenhum pouco disso, achava aqueles repórteres, chamados de âncoras, tão chatos quanto às verdadeiras âncoras de um navio, queria a TV e o sofá da sala, e também queria assistir algo mais divertido, colorido e fácil de entender. Conforto e diversão, estaria feliz. Porém, aquele garoto tinha apenas nove anos, não dezesseis, trinta, ou cinqüenta e poucos. Dez anos depois, ainda enxergo em muitos adultos aquela criança que já fui. 

       Nunca estar informado, chamo a atenção para a informação de fato e imparcial, e não se interessar pelas questões que dizem respeito a coletividade é algo normal. Logo, você é normal. É isso que eles querem que você pense. Aliás, eles não querem que você pense, na verdade o que acontece é que você faz parte da maioria, da massa (de manobra), simples fantoches. Quando digo “eles” estou me referindo ao poder, aos políticos corruptos, aos grandes empresários detentores dos meios de produção, aos governantes, a quem de alguma forma precisa estar acima de outros, lucrando e mantendo o controle. Isso ocorre desde os primórdios, muito antes de quando cada indivíduo doou sua parcela de poder à um representante político, que já foi tribal e sanguinário, mas hoje se diz Estatal, defensor da democracia e da dignidade da pessoa humana. 

       Na atual juventude qualquer forma de agir é mais popular que a informação e discussão crítica, a busca pelo conhecimento. O termo 'crítica' tem sua origem no grego "krinein", que significa 'separar', 'julgar'. Em um ambiente que não se exerce esse julgamento onde o juiz é a razão, podemos perceber o crítico e o cético se tornarem pessoas "polêmicas", apenas. Defender essa visão é também correr o risco de ser taxado de “intelectual” pejorativamente, pois, segundo o senso comum, não existe o caminho para o intelectualismo – doutrina que toma como base a busca pelo racionalismo (razão/raciocínio) e empirismo (experiência/comprovação). O que existe é a dualidade intelectual: aqueles que já são intelectuais (provavelmente mortos e estampados em livros ou CDs) e os que não são. As pessoas tendem à se conformarem que não são e não poderão ser. Pronto, está implantada a ignorância, nos mais diversos campos das relações sociais.

        Se você faz parte da massa, não é ninguém, só tem valor quando as eleições estão próximas, ou quando a máquina precisa de mais carvão. É dado um pouco de liberdade e oportunidade, e então o plano se completa, vivemos nossas vidinhas, nos nossos empreguinhos, temos nosso sofázinho, assistimos nossa novelinha, bebemos aquela cervejinha e temos a total liberdade... para arrotar e mudar de canal. Tudo isso, pois os nossos governantes ou patrões são bons, nós realmente acreditamos que eles estão lá fazendo tudo por todos, preocupados. Mas, não, eles só querem que nós continuemos idiotas, limitados, desinformados e presos em nossas próprias vidas, sem se preocupar com as decisões que são tomadas nos palácios neoclássicos, com o dinheiro que mataria fome e construiria lares, ou com a justiça que prenderia corruptos e tomaria decisões justas. 

       Diariamente presenciamos sinais de trânsito cheios de famílias passando por necessidades, e nos jornais os deputados aumentando os seus salários, não fazemos nada. Mas o que poderíamos fazer? Nós podemos e devemos agir como verdadeiros policiais: primeiro conversamos, se o diálogo não adiantar partimos para a ação. Políticos eleitos devem ganhar salários justos e determinados pelo povo, ou, como ocorre na “sangrenta ditadura cubana” onde se você é eleito para a Assembléia Nacional do Povo (sim, isso existe, só que a mídia não faz questão de mostrar) apenas continua ganhando o seu salário anterior, seja de professor ou advogado, alguma ajuda de custo para fazer nossa representação é necessário, mas deveria ocorrer sob forte fiscalização de um instituto independente e popular, tudo sem luxo. Políticos deveriam ser obrigados a usufruírem do maravilhoso sistema de educação e saúde os quais criaram e mantém. Precisamos colocar na cabeça que nós, cidadãos eleitores, somos os patrões de quem elegemos, se o colocamos lá, também podemos tirá-lo, a qualquer hora. Ninguém obriga ninguém a ser deputado, presidente ou prefeito, se buscaram é porque desejam de coração lutar para melhorar a situação de seu povo, ou pelo menos assim deveria ser. Precisamos policiar, com algemas no cinto e lanterna na mão. Esqueçam as cestas básicas de fim de ano, as misérias do fim de mês, olhem para os vossos filhos morrerem de frio, de fome, olhem eles crescendo e não sendo ninguém, pois não tiveram condições para uma boa educação ou emprego, prestem atenção em suas vestes que aos poucos perdem a cor e se rasgam, enquanto que seus representantes enriquecem, roubam, matam e humilham. Não esperem aqueles jovens de classe alta e média que se dizem “revolucionários”, participantes de uniões e ideologias. Não, eles não farão nada por você, também só querem o poder, pensam que não, mas é só presenciarem de dentro como o sistema funciona, e se sentirem sufocados pelos setores que precisam da massa alienada, para logo desistirem do antigo ideal, esquecer de quem já foram, esquecer que em ditaduras passadas apanharam feito burros desses engravatados. Brasília está cheia deles. A alienação é clara, as campanhas políticas se transformaram em grandes comerciais de TV, não existem mais propostas e sim propaganda, marketing. E isso é tão descarado que candidato nenhum esconde mais seus “marketeiros”, os responsáveis por criar o tal “homem bom, honesto e íntegro”. 

       Quando os alienados começarem a entender tudo isso, e sentirem a indignação pulsar misturada ao sangue, estarão prontos para revolucionar. Seus braços ainda estarão fortes, os porcos prontos para serem mortos, o ouro para ser distribuído, as grandes terras para serem repartidas, e a justiça para ser feita. Enquanto isso não acontecer, a massa popular ainda será usada, pisada e, caberá aos governantes convencer que a única verdade é a que está sendo é imposta. 

       Acredito no dia em que todos nós, camponeses rurais e urbanos, trabalhadores na terra e no concreto, faremos diferente do que Rousseau constatou: “Os povos, uma vez acostumados a senhores, não podem mais passar sem eles. Se tentam sacudir o jugo, afastam-se tanto mais da liberdade quanto, tomando por ela uma licença desenfreada que lhe é imposta, suas revoluções os entregam quase sempre a sedutores que só fazem agravar as suas cadeias”¹. Se o uísque é o melhor amigo do homem, como disse o poeta Vinícius de Moraes, eu digo que a alienação é a nossa melhor amiga, pois precisamos fazer novas amizades.


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¹ Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. Jean-Jacques Rousseau.