quarta-feira, 20 de abril de 2011

Jesus Cristo



Jesus de Nazaré, para seus seguidores – os cristãos – o “Cristo”, o mesmo que “ungido” para os gregos, e “messias” no hebraico.  Este ser, que é totalmente humano e ao mesmo tempo divino, não por ser filho de Deus ou se confundir com ele, mas por ter desenvolvido uma grande conduta espiritual e social em seu tempo. Não se preocupou apenas com teorias e profecias religiosas, foi alguém de ação, de prática, inclinado para o bem, para a virtude. No quesito “divindade”, acompanho o pensamento islâmico, o qual configura Jesus como um ser não divino, no sentido deus, pois não acredito na característica “filho de Deus”, mas não chego ao pensamento conservador judaico de que Jesus seria um “obstáculo”, ou motivo para heresia. Contudo, tenho dúvidas sobre a necessidade ou função de um messias, um humano de espiritualidade extraordinária, que provoque de fato a paz e o bem em todo o mundo, ou simplesmente nos traga a salvação em um futuro apocalíptico. Se algum dia acontecer de aparecer um, com certeza ele não estará aqui por alguma nação, tribo ou religião em especial, muito menos será descendente do Rei David. Ao contrário do que se tem hoje entre os grandes líderes religiosos, Jesus Cristo não poderia ser representado pelo famoso provérbio popular – faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço – considerando o significado dado por Thomas Fuller onde “um provérbio é muita coisa concentrada em poucas palavras”.
A razão me faz ver que o messianismo nada mais é do que o desejo dos antigos de ter alguém que os libertassem da opressão de outros povos, alguém que teria coragem para desafiar, liderar, implantar essa ideia de libertação nas cabeças oprimidas.  Essa pessoa, claro, seria especial. Mas, foram além, começaram a mistificar esse “libertador”, apenas ser herói não bastava, Hércules poderia matar mil leões, quinhentas hidras e, capturar todos os javalis e cavalos da Grécia, mas quem seria ele, qual crédito suas histórias teriam, se ele não fosse apontado como “o filho de Zeus”. Por outro lado, se a tribo estava livre, agora seria preciso alguém que tornasse o Deus mais próximo, mais real. Logo, a ideia de um filho, um enviado, um mensageiro, do “Todo Poderoso”, seria uma crença inteligente e interessante de se ter.
Em tempos antigos autoproclamar-se “O messias” era muito mais comum do que pensamos. Certa vez, um judeu chamado Teudas, conseguiu juntar 400 pessoas e foi decapitado, em outro momento um egípcio supostamente teria conseguido 30.000 apoiantes, segundo o historiador judaico Flávio Josefo. Quase todos, ou todos, com o mesmo ideal de libertação, de abrir águas e derrubar muralhas. Era o primórdio das Revoluções políticas e socioeconômicas modernas.
O Cristo em Jesus não é aquele que andou sobre as águas, transformou água em vinho (este “milagre” tem muito da cultura grega, do deus Dionísio, e mais tarde para os romanos: Baco, deus das festas e do vinho), que acalmou vento e mar, que acordou mortos e, outros tantos feitos mitológicos, ou melhor, milagrosos. Não. O Cristo está no Jesus que andou por entre desertos, montanhas e cidades, escutando e atendendo pobres, loucos, possuídos e moribundos; que pregou humildade, perdão, bondade, fé, humanismo, ágape ("que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei": João 15:10), respeito e amor ao próximo e a Deus (“Amar a Deus de todo coração, de toda alma e de todo espírito e ao próximo como a ti mesmo”: Mateus 22:37-39), sendo Este, de fato um ser divino e criador de tudo; que foi revolucionário, crítico (com 12 anos intrigou os doutores do Templo pela facilidade com que aprendia a doutrina, e por suas perguntas intrigantes: Lucas 2:41-52); cuspido e esbofeteado, zombado, acusado, preso e morto por defender seus ideais; crucificado por ter sido aclamado rei, mesmo sendo pobre e montado em um jumento.
Portanto, a ressurreição, fato central do cristianismo e da esperança humana de salvação, não é o que torna Jesus um ser com aspecto de divino, mas o que ele fez e falou como pessoa de carne e osso. Ela precisa ser interpretada longe das ilustrações católicas, com anjos, terremotos, sepulcro vazio e ascensão. Não que isso seja impossível de ter acontecido, porém o que está representado e o que deveria ser retirado desse tema, é o seguinte: O líder morre, a pilastra fundamental é derrubada, a mente privilegiada do grupo, o ser com a espiritualidade mais avançada daquela nova forma de pensar, o profeta, o messias. O que fazer? Como continuar? Considerando essa situação, a ressurreição seria todo o processo de auto-afirmação da religião cristã, realizado pelos discípulos e seguidores depois da morte do “ungido”. A luta, a perseguição, as mortes, as reuniões clandestinas em catacumbas, tudo para o cristianismo não morrer junto aquele homem. Eles precisavam mostrar que o Messias ainda vivia, mesmo que em outra dimensão – no céu (“sentado à destra de Deus”: Mc 16, 19) – e nos corações de quem tem fé. A doutrina cristã foi então aceita e respeitada, as pessoas continuaram acreditando. Jesus voltou a viver, ou continuou vivendo. Ressuscitou.
A ideia do homem que foi morto e voltou a viver, acabou sendo um diferencial cativante, apesar de não ser novidade no sentido literário, preencheu um pouco do vazio e do medo relacionado ao “pós-morte”, foi lançada uma esperança de salvação. Até surgiu a ideia da segunda vinda de Jesus, ou seja, ele seria messias duas vezes, e nessa segunda vez salvará todo o mundo da besta, do anticristo, do senhor das trevas. Se, foi natural ou intencionalmente, não se sabe. Mas, é interessante o fato de que características da história de Jesus Cristo se assemelham àquelas da cultura politeísta, dos rituais, dos deuses e semideuses do Monte Olimpo, mais tarde reformulados pelos romanos. A glória, os personagens humanos com intervenções e ligações divinas, filhos de deuses e mães virgens, muito em comum.
O que me chama mais atenção, nos momentos finais do Cristo, é a cena retratada na Bíblia onde Jesus já crucificado, 3 horas antes de sua morte, teria dito: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mateus 27:46). Ora, ele (segundo as escrituras) cansou de dizer aos apóstolos que iria morrer, que existiria um traidor. A morte faria parte da sua caminhada, da sua profecia, e, considerando toda a sua autoconfiança – ele foi acusado exatamente de blasfemar ao dizer-se Deus e a trair Roma ao dizer-se rei dos judeus – questões me assolam: Porque Jesus teria se desesperado no final? E porque isso, esse sinal de fraqueza e de contradição à sua condição divina, essa imagem de um Jesus que não queria morrer e que foi abandonado, teria sido eternizado nas escrituras sagradas?
Independente de todo o romance e mistificação que envolve essa história, falarei dela para meu filho. Buscarei não me alongar na parte dos superpoderes, pois sei que crianças gostam disso, a Igreja também sabe, e conseguiu utilizar esse método principalmente nos adultos. Falarei de Jesus Cristo, que também foi criança, nasceu em Belém, filho de Maria e José, possivelmente um carpinteiro, um homem que foi além de sua própria religião, defendeu e acreditou em um Deus criador, maior que tudo e que amava suas criaturas. Ainda que humilde, em uma sociedade primitiva de dois mil anos atrás, já pedia para amarmos e respeitarmos uns aos outros.