sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Fracasso conformado

     O conformismo faz do fracasso uma característica inerente àquilo que o aceita, seja o homem ou as suas instituições, até mesmo uma nação pode sofrer deste mal. O fracasso acaba por ser visto como um simples adjetivo, uma característica que cabe a você, um determinado aspecto de um povo, e alimentar esse hábito gasta muito menos energia do que a necessária para uma transformação. Combater o conformismo exige a dissecação do fracasso, é indicado entender as razões que o levaram a tal ponto, e enxergar este como não sendo um ponto final. O conformismo se abastece com a combustão diária de pequenas e médias parcelas de energia, que no final dará uma quantia imensuravelmente maior que aquela que viabilizaria a construção de uma nova realidade. Porém, sustentar o fracasso é algo impossível em longo prazo, ele é como o núcleo de uma estrela, que lentamente suga toda a energia do corpo a que pertence, e quando a estrela não tem mais energia a oferecer é engolida. Contudo, o fracasso – assim como o núcleo – explode, esse fenômeno é conhecido pelos astrônomos como supernova, e em uma escala de comparação poderia representar o suicídio ou a loucura de um homem, a revolução de um povo ou até mesmo sua extinção.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Entre homens e estrelas




         Eu queria ter gostado da matemática, queria ter amado a física desde cedo, estar tão íntimo do raciocínio lógico de nível científico quanto amantes em amor.
Permitir-me-ia desistir de entender as pessoas, de estudar os assuntos humanos, de fazer conjunturas sobre doutrinas velhas a fim de tornar a justiça dos homens mais justa e moderna, menos colunas gregas e mais povo nos tribunais, mais realidade e razoabilidade nas sentenças. A interpretação dos princípios morais, ou constitucionais de direito quais sejam estão em constante mudança, e assim que seja. As teorias da psique, que hoje em dia é em toda - ou quase isto - freudiana, aparece por muitas vezes como algo mais surreal que a própria loucura, que o diga a lobotomia. Desisto. Quero entender o universo, que apesar de infinito nos traz mais respostas que a análise de outro ser humano. Entender a nós mesmos já não é nada fácil. Estrelas apenas nascem e morrem, não desejam amor, dinheiro ou felicidade.
Desejaria remedir a distância de todas as constelações em relação as pirâmides de Gizé, apenas para brincar, apenas para lançar teorias e reforçar conspirações ufologistas e rir disto no intervalo do almoço com meus amigos cientistas. Eu apenas teria amigos cientistas. Quero derrubar o Big Bang, apesar de caduco; dizer a data exata da explosão do sol no futuro, para que comecem a serem vendidos os ingressos e camarotes hereditários para o esperado dia da extinção humana; chegar ao ponto de compreender e explicar claramente a Teoria das Cordas, trabalhar no LHC, dominar a Física Quântica, provar que existem partículas mais rápidas que a velocidade da luz, e depois levar flores ao túmulo do grande Einstein, para me desculpar por ter destruído toda a base da Física moderna; ter um emprego na famosa agência espacial americana, ou em uma agência espacial russa qualquer, desde que astronauta fosse, viajar ao espaço ainda que em órbita baixa, nem que seja para reabastecer a despensa da Estação Espacial Internacional; decorar todas as nomenclaturas relacionadas aos quarks, descobrir planetas e sistemas assim como as antigas nações supremas dos mares descobriram um novo mundo. Talvez, ser apenas um singelo cosmologista, que ensina em uma modesta universidade três dias na semana, e nos outros dois é professor voluntário de ciências em uma escola pública.
As miudezas das relações interpessoais – de Aristóteles ou Bush, só estariam presentes aos feriados, em romances dostoievskianos, em uma novela de Kafka ao meio dia, ou em um poema de Pessoa ao dormir. Neruda ao vinho, Beccaria para passar o tempo, e Coppola nas noites de insônia. Contudo, percebo que o homem e sua história são tão profundos quanto qualquer buraco negro que eu venha a constatar, ambos podem nos levar a outro lugar, assim como um deles nos levaria à uma imensa distância em um ínfimo prazo de tempo, o estudo da história poderá adiantar o futuro sem que preciso seja a espera de um século, apenas lembrando do passado. Entre homens e estrelas, confuso, eu escolho descobrir.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Bem-estar e o desdouro da retórica religiosa

    

    Até hoje não entendemos como Hitler conseguiu convencer todo um país, todo um povo, muitas são as hipóteses. Falo não somente o convencimento em si, mas as razões que justificavam tal ideal nazista de bem comum. Então, vemos novamente pessoas medianas convencerem milhões, no atual tempo, e com todos os meios propícios de resistência e informação. Volto a não entender. Pequenos e imensos bunkers de profetas, filhos de Hermes, sofistas dotados do dom da interpretação sagrada, ou, grandes publicitários, grandessíssimos louvores, domingos, sábados, que valem toda uma semana de condutas contrárias, curas putativas, fantasmas vestidos e de relógio que trazem mensagens de um mundo sem pudor e atemporal, casas de lucro, bilhões de batizados e irmãos, seguidores e financiadores de algum sentido. O sentido na realidade é a busca por este com a sensação de já ter encontrado.

     O latim ruiu, o velho testemunho foi confirmado como conto de fadas por seus próprios guardiões, pastores deixando suas ovelhas para responderem crimes, terras santas lavadas... de sangue e discórdia, trincheiras bentas, barbas sem sentido, talvez marujos de um olho só. Ética e moral são  valores essenciais, no entanto, parte do regramento para fins de ordem e governo já nos faz desnecessária ou velha, de maneira igual os dogmas. Os demônios foram todos extintos, Freud reina. Assim como uma mãe que bem quer àquele que bem faz ao filho, o Criador, próximo se faz quando próximos estamos de suas criaturas, sem rituais surrealistas e livros absolutos, racionalmente, e sem tradutores; aulas de astronomia e sociologia, ao invés de catecismos. Não existe ninguém em um mundo paralelo e azul requerendo orações e provas de amor, decretando verdades e despachando os filhos defeituosos para a vala, assim como fazem os indígenas, e como fizeram os espartanos no mundo antigo. Deixem isso para os autores romancistas, e sejam ação. Reunir-vos sim, porém deixando divindades e pompas no devido Olimpo, morto na história, e as grandes estruturas para os centros de abrigo e casas de apoio.

     A busca pelo bem-estar é criação do concreto, da moeda, ilusão da fé. Contudo, já implantada em nossos genes, assim como o otimismo - que segundo recentes pesquisas científicas é realmente genético. A melhor igreja é aquela que nunca foi, aquela dentro de nós, a autoevolução, entendendo os vazios, buscando conhecimento e qualidades, entendendo os componentes cognitivos e culturais que nos fazem, não esperando a plenitude extraterrestre, e aceitando a ciência como produtora da cura e da versão oficial dos fatos . Ryff e Keyes (1995)¹ bem definiram os fatores para o wellbeing (bem-estar): autoaceitação; a sensação de se ter controle sobre o ambiente; a sensação de se viver uma vida cheia de sentido; a busca de crescimento pessoal; relações sociais positivas; autonomia.
¹_Ryff, C.D. & Keyes, C.L.M. (1995). The structure of psychological well-being revised.Journal of Personality and Social Psychology,69, 719-727.

domingo, 1 de maio de 2011

Manifesto sobre a alienação entre os homens modernos

       

       Antes de tudo, quero que você leitor, responda algumas questões: Possui algum cargo político onde representa outros cidadãos? É um grande empresário? É um ativista empenhado em alguma mudança social ou política? Já foi preso, perseguido, investigado ou agredido por participar de alguma forma de manifestação contra ou a favor de algo? Se não respondeu positivamente a nenhuma das questões, este texto também é para você.

       Lembro que quando eu era criança ficava intrigado ao ver meu pai assistir a todos os noticiários que podia, diversas vezes ao dia, em diferentes canais. Eu não gostava nenhum pouco disso, achava aqueles repórteres, chamados de âncoras, tão chatos quanto às verdadeiras âncoras de um navio, queria a TV e o sofá da sala, e também queria assistir algo mais divertido, colorido e fácil de entender. Conforto e diversão, estaria feliz. Porém, aquele garoto tinha apenas nove anos, não dezesseis, trinta, ou cinqüenta e poucos. Dez anos depois, ainda enxergo em muitos adultos aquela criança que já fui. 

       Nunca estar informado, chamo a atenção para a informação de fato e imparcial, e não se interessar pelas questões que dizem respeito a coletividade é algo normal. Logo, você é normal. É isso que eles querem que você pense. Aliás, eles não querem que você pense, na verdade o que acontece é que você faz parte da maioria, da massa (de manobra), simples fantoches. Quando digo “eles” estou me referindo ao poder, aos políticos corruptos, aos grandes empresários detentores dos meios de produção, aos governantes, a quem de alguma forma precisa estar acima de outros, lucrando e mantendo o controle. Isso ocorre desde os primórdios, muito antes de quando cada indivíduo doou sua parcela de poder à um representante político, que já foi tribal e sanguinário, mas hoje se diz Estatal, defensor da democracia e da dignidade da pessoa humana. 

       Na atual juventude qualquer forma de agir é mais popular que a informação e discussão crítica, a busca pelo conhecimento. O termo 'crítica' tem sua origem no grego "krinein", que significa 'separar', 'julgar'. Em um ambiente que não se exerce esse julgamento onde o juiz é a razão, podemos perceber o crítico e o cético se tornarem pessoas "polêmicas", apenas. Defender essa visão é também correr o risco de ser taxado de “intelectual” pejorativamente, pois, segundo o senso comum, não existe o caminho para o intelectualismo – doutrina que toma como base a busca pelo racionalismo (razão/raciocínio) e empirismo (experiência/comprovação). O que existe é a dualidade intelectual: aqueles que já são intelectuais (provavelmente mortos e estampados em livros ou CDs) e os que não são. As pessoas tendem à se conformarem que não são e não poderão ser. Pronto, está implantada a ignorância, nos mais diversos campos das relações sociais.

        Se você faz parte da massa, não é ninguém, só tem valor quando as eleições estão próximas, ou quando a máquina precisa de mais carvão. É dado um pouco de liberdade e oportunidade, e então o plano se completa, vivemos nossas vidinhas, nos nossos empreguinhos, temos nosso sofázinho, assistimos nossa novelinha, bebemos aquela cervejinha e temos a total liberdade... para arrotar e mudar de canal. Tudo isso, pois os nossos governantes ou patrões são bons, nós realmente acreditamos que eles estão lá fazendo tudo por todos, preocupados. Mas, não, eles só querem que nós continuemos idiotas, limitados, desinformados e presos em nossas próprias vidas, sem se preocupar com as decisões que são tomadas nos palácios neoclássicos, com o dinheiro que mataria fome e construiria lares, ou com a justiça que prenderia corruptos e tomaria decisões justas. 

       Diariamente presenciamos sinais de trânsito cheios de famílias passando por necessidades, e nos jornais os deputados aumentando os seus salários, não fazemos nada. Mas o que poderíamos fazer? Nós podemos e devemos agir como verdadeiros policiais: primeiro conversamos, se o diálogo não adiantar partimos para a ação. Políticos eleitos devem ganhar salários justos e determinados pelo povo, ou, como ocorre na “sangrenta ditadura cubana” onde se você é eleito para a Assembléia Nacional do Povo (sim, isso existe, só que a mídia não faz questão de mostrar) apenas continua ganhando o seu salário anterior, seja de professor ou advogado, alguma ajuda de custo para fazer nossa representação é necessário, mas deveria ocorrer sob forte fiscalização de um instituto independente e popular, tudo sem luxo. Políticos deveriam ser obrigados a usufruírem do maravilhoso sistema de educação e saúde os quais criaram e mantém. Precisamos colocar na cabeça que nós, cidadãos eleitores, somos os patrões de quem elegemos, se o colocamos lá, também podemos tirá-lo, a qualquer hora. Ninguém obriga ninguém a ser deputado, presidente ou prefeito, se buscaram é porque desejam de coração lutar para melhorar a situação de seu povo, ou pelo menos assim deveria ser. Precisamos policiar, com algemas no cinto e lanterna na mão. Esqueçam as cestas básicas de fim de ano, as misérias do fim de mês, olhem para os vossos filhos morrerem de frio, de fome, olhem eles crescendo e não sendo ninguém, pois não tiveram condições para uma boa educação ou emprego, prestem atenção em suas vestes que aos poucos perdem a cor e se rasgam, enquanto que seus representantes enriquecem, roubam, matam e humilham. Não esperem aqueles jovens de classe alta e média que se dizem “revolucionários”, participantes de uniões e ideologias. Não, eles não farão nada por você, também só querem o poder, pensam que não, mas é só presenciarem de dentro como o sistema funciona, e se sentirem sufocados pelos setores que precisam da massa alienada, para logo desistirem do antigo ideal, esquecer de quem já foram, esquecer que em ditaduras passadas apanharam feito burros desses engravatados. Brasília está cheia deles. A alienação é clara, as campanhas políticas se transformaram em grandes comerciais de TV, não existem mais propostas e sim propaganda, marketing. E isso é tão descarado que candidato nenhum esconde mais seus “marketeiros”, os responsáveis por criar o tal “homem bom, honesto e íntegro”. 

       Quando os alienados começarem a entender tudo isso, e sentirem a indignação pulsar misturada ao sangue, estarão prontos para revolucionar. Seus braços ainda estarão fortes, os porcos prontos para serem mortos, o ouro para ser distribuído, as grandes terras para serem repartidas, e a justiça para ser feita. Enquanto isso não acontecer, a massa popular ainda será usada, pisada e, caberá aos governantes convencer que a única verdade é a que está sendo é imposta. 

       Acredito no dia em que todos nós, camponeses rurais e urbanos, trabalhadores na terra e no concreto, faremos diferente do que Rousseau constatou: “Os povos, uma vez acostumados a senhores, não podem mais passar sem eles. Se tentam sacudir o jugo, afastam-se tanto mais da liberdade quanto, tomando por ela uma licença desenfreada que lhe é imposta, suas revoluções os entregam quase sempre a sedutores que só fazem agravar as suas cadeias”¹. Se o uísque é o melhor amigo do homem, como disse o poeta Vinícius de Moraes, eu digo que a alienação é a nossa melhor amiga, pois precisamos fazer novas amizades.


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¹ Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. Jean-Jacques Rousseau.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Jesus Cristo



Jesus de Nazaré, para seus seguidores – os cristãos – o “Cristo”, o mesmo que “ungido” para os gregos, e “messias” no hebraico.  Este ser, que é totalmente humano e ao mesmo tempo divino, não por ser filho de Deus ou se confundir com ele, mas por ter desenvolvido uma grande conduta espiritual e social em seu tempo. Não se preocupou apenas com teorias e profecias religiosas, foi alguém de ação, de prática, inclinado para o bem, para a virtude. No quesito “divindade”, acompanho o pensamento islâmico, o qual configura Jesus como um ser não divino, no sentido deus, pois não acredito na característica “filho de Deus”, mas não chego ao pensamento conservador judaico de que Jesus seria um “obstáculo”, ou motivo para heresia. Contudo, tenho dúvidas sobre a necessidade ou função de um messias, um humano de espiritualidade extraordinária, que provoque de fato a paz e o bem em todo o mundo, ou simplesmente nos traga a salvação em um futuro apocalíptico. Se algum dia acontecer de aparecer um, com certeza ele não estará aqui por alguma nação, tribo ou religião em especial, muito menos será descendente do Rei David. Ao contrário do que se tem hoje entre os grandes líderes religiosos, Jesus Cristo não poderia ser representado pelo famoso provérbio popular – faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço – considerando o significado dado por Thomas Fuller onde “um provérbio é muita coisa concentrada em poucas palavras”.
A razão me faz ver que o messianismo nada mais é do que o desejo dos antigos de ter alguém que os libertassem da opressão de outros povos, alguém que teria coragem para desafiar, liderar, implantar essa ideia de libertação nas cabeças oprimidas.  Essa pessoa, claro, seria especial. Mas, foram além, começaram a mistificar esse “libertador”, apenas ser herói não bastava, Hércules poderia matar mil leões, quinhentas hidras e, capturar todos os javalis e cavalos da Grécia, mas quem seria ele, qual crédito suas histórias teriam, se ele não fosse apontado como “o filho de Zeus”. Por outro lado, se a tribo estava livre, agora seria preciso alguém que tornasse o Deus mais próximo, mais real. Logo, a ideia de um filho, um enviado, um mensageiro, do “Todo Poderoso”, seria uma crença inteligente e interessante de se ter.
Em tempos antigos autoproclamar-se “O messias” era muito mais comum do que pensamos. Certa vez, um judeu chamado Teudas, conseguiu juntar 400 pessoas e foi decapitado, em outro momento um egípcio supostamente teria conseguido 30.000 apoiantes, segundo o historiador judaico Flávio Josefo. Quase todos, ou todos, com o mesmo ideal de libertação, de abrir águas e derrubar muralhas. Era o primórdio das Revoluções políticas e socioeconômicas modernas.
O Cristo em Jesus não é aquele que andou sobre as águas, transformou água em vinho (este “milagre” tem muito da cultura grega, do deus Dionísio, e mais tarde para os romanos: Baco, deus das festas e do vinho), que acalmou vento e mar, que acordou mortos e, outros tantos feitos mitológicos, ou melhor, milagrosos. Não. O Cristo está no Jesus que andou por entre desertos, montanhas e cidades, escutando e atendendo pobres, loucos, possuídos e moribundos; que pregou humildade, perdão, bondade, fé, humanismo, ágape ("que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei": João 15:10), respeito e amor ao próximo e a Deus (“Amar a Deus de todo coração, de toda alma e de todo espírito e ao próximo como a ti mesmo”: Mateus 22:37-39), sendo Este, de fato um ser divino e criador de tudo; que foi revolucionário, crítico (com 12 anos intrigou os doutores do Templo pela facilidade com que aprendia a doutrina, e por suas perguntas intrigantes: Lucas 2:41-52); cuspido e esbofeteado, zombado, acusado, preso e morto por defender seus ideais; crucificado por ter sido aclamado rei, mesmo sendo pobre e montado em um jumento.
Portanto, a ressurreição, fato central do cristianismo e da esperança humana de salvação, não é o que torna Jesus um ser com aspecto de divino, mas o que ele fez e falou como pessoa de carne e osso. Ela precisa ser interpretada longe das ilustrações católicas, com anjos, terremotos, sepulcro vazio e ascensão. Não que isso seja impossível de ter acontecido, porém o que está representado e o que deveria ser retirado desse tema, é o seguinte: O líder morre, a pilastra fundamental é derrubada, a mente privilegiada do grupo, o ser com a espiritualidade mais avançada daquela nova forma de pensar, o profeta, o messias. O que fazer? Como continuar? Considerando essa situação, a ressurreição seria todo o processo de auto-afirmação da religião cristã, realizado pelos discípulos e seguidores depois da morte do “ungido”. A luta, a perseguição, as mortes, as reuniões clandestinas em catacumbas, tudo para o cristianismo não morrer junto aquele homem. Eles precisavam mostrar que o Messias ainda vivia, mesmo que em outra dimensão – no céu (“sentado à destra de Deus”: Mc 16, 19) – e nos corações de quem tem fé. A doutrina cristã foi então aceita e respeitada, as pessoas continuaram acreditando. Jesus voltou a viver, ou continuou vivendo. Ressuscitou.
A ideia do homem que foi morto e voltou a viver, acabou sendo um diferencial cativante, apesar de não ser novidade no sentido literário, preencheu um pouco do vazio e do medo relacionado ao “pós-morte”, foi lançada uma esperança de salvação. Até surgiu a ideia da segunda vinda de Jesus, ou seja, ele seria messias duas vezes, e nessa segunda vez salvará todo o mundo da besta, do anticristo, do senhor das trevas. Se, foi natural ou intencionalmente, não se sabe. Mas, é interessante o fato de que características da história de Jesus Cristo se assemelham àquelas da cultura politeísta, dos rituais, dos deuses e semideuses do Monte Olimpo, mais tarde reformulados pelos romanos. A glória, os personagens humanos com intervenções e ligações divinas, filhos de deuses e mães virgens, muito em comum.
O que me chama mais atenção, nos momentos finais do Cristo, é a cena retratada na Bíblia onde Jesus já crucificado, 3 horas antes de sua morte, teria dito: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mateus 27:46). Ora, ele (segundo as escrituras) cansou de dizer aos apóstolos que iria morrer, que existiria um traidor. A morte faria parte da sua caminhada, da sua profecia, e, considerando toda a sua autoconfiança – ele foi acusado exatamente de blasfemar ao dizer-se Deus e a trair Roma ao dizer-se rei dos judeus – questões me assolam: Porque Jesus teria se desesperado no final? E porque isso, esse sinal de fraqueza e de contradição à sua condição divina, essa imagem de um Jesus que não queria morrer e que foi abandonado, teria sido eternizado nas escrituras sagradas?
Independente de todo o romance e mistificação que envolve essa história, falarei dela para meu filho. Buscarei não me alongar na parte dos superpoderes, pois sei que crianças gostam disso, a Igreja também sabe, e conseguiu utilizar esse método principalmente nos adultos. Falarei de Jesus Cristo, que também foi criança, nasceu em Belém, filho de Maria e José, possivelmente um carpinteiro, um homem que foi além de sua própria religião, defendeu e acreditou em um Deus criador, maior que tudo e que amava suas criaturas. Ainda que humilde, em uma sociedade primitiva de dois mil anos atrás, já pedia para amarmos e respeitarmos uns aos outros.

domingo, 6 de março de 2011

Angústia, codinome Amor.













Sinto saudade do seu corpo... admirava escondido
Provocaria inveja na grande deusa da beleza e do amor.
O maior afrodisíaco que conheci foi a sua pele
Ó Afrodite, quem és tu depois dela?

Como em uma travessura infantil, nós nos arriscamos
Pulamos em um precipício hedonista criado pelo momento
Tudo para sentir aquela verdade que corria em nossas veias.

Nossos casos, por acaso, segredos de tantos atos.
Guardei seu perfume, seu instinto, seu... beijo
Toda a sua conversa errada.
Era profundo, não apenas prazer.

Depois das núpcias nos tornávamos menos indiferentes
Eu sempre ganhava um sorriso antes e, outro depois.
Seu olhar satisfeito, paralelo à minha saciação.

Você se foi rápido demais, como em todas as outras vezes
Mas agora é para sempre.
Me deixando um último sorriso como despedida
Lembrança perdida no meu passado.

Se eu fosse Júpiter também te faria Aquarius.
Estou cansado dessa angústia que envolve o meu desejo de você
Está rendido e desarmado, esse seu herói byroniano que sou.



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Herói byroniano: http://pt.wikipedia.org/wiki/Her%C3%B3i_byroniano

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Um dia de comemoração em Blessed Hill


Era uma tarde bem diferente daquelas típicas em época de colheita do algodão. Todos os negros daquele humilde vilarejo estavam reunidos e felizes festejando ao som de palmas, gritos e um velho banjo. O dia em comemoração era aquele em que seus filhos finalmente puderam colocar os pés onde os outros garotos, brancos, sempre puderam por algum motivo.

Apertadas naquele salão dezenas de vozes em coro cantavam os versos “This little light of mine, I'm gonna let it shine”. Por trás de toda aquela melodia estava o sonho de liberdade e igualdade. Aquele da retórica afiada do Dr. Luther King. A Felicidade estava traduzida nos sorrisos de todos, e a esperança naqueles olhos tão acostumados a derramarem lágrimas e a serem espremidos na reação involuntária da pálpebra em uma tentativa de proteção contra o sol voraz do Alabama.  

A velha senhora, de aparência sofrida e sentada lá no fundo possuía uma linda camélia em suas mãos, as mesmas que em tempos antigos já estiveram fortemente amarradas por dois dias e duas noites a um grande pinheiro em uma fazenda trinta milhas distante. Castigo por ser negra e ter adoecido seriamente enquanto havia trabalho na lavoura. A admiração das crianças na energia e talento do jovem músico no palco é quebrada quando de repente alguém comenta sobre as saborosas amoras-silvestres. Logo, todos aqueles pequenos estavam devorando a plantação atrás do Hope Saloon. 

Uma Boa terra, alguns animais corpulentos e outros nem tanto, também existia um riacho demasiadamente sereno. Os mais velhos batizaram aquele lugar de “Blessed Hill” – Colina Abençoada.

sábado, 13 de novembro de 2010

Garota Cervantes



Certa noite de meia lua, ela me fez refletir o quanto mudei sua vida, seus pensamentos, seus hábitos, seu cabelo, mesmo sendo estes tão pessoais.
Porém, seus elogios e reflexões amistosas nunca vinham sozinhos. Eram como belos cavalos brancos, ávidos de glória, e que blindados com sua armadura imponente disparam na frente das tropas carregando sobre eles os mais bravos guerreiros de espadas afiadas com o objetivo de causar o maior estrago possível na defesa do campo adversário, facilitando o restante do ataque.
Foi então que ao final de seus dizeres, com meu escudo já  ao chão, ela conseguiu me surpreender com a última parte do seu monólogo – suas reflexões finais são sempre as responsáveis pelos maiores dramas que já assolaram o meu pobre e suíço cotidiano –  desta vez ela se comparou á uma jubarte que sempre reinou sozinha em seu oceano, alimentando-se de milhares de peixes pequenos, mas que por algum motivo se sentiu atraída pela praia (eu), então vai em sua direção, e aos poucos percebe que está cada vez mais no raso, continua, mesmo sabendo que encalhará e não sobreviverá na areia (meus braços).
Completamente desconcertado beijo-lhe a face como quem se desculpa. Calado, sofri o resto daquela noite pela culpa que sua comparação, tão profunda e quixotesca, pretensiosamente me atribuiu.



 _
 Miguel de Cervantes foi romancista, dramaturgo e poeta espanhol. Sua obra prima, Dom Quixote.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Saudosos Guerreiros


Saudosos guerreiros que tanto me orgulham
De lutas e conquistas históricas
Artífices combatentes, revolucionários!
Fazem-me ter fé em ideologias
Mantêm a chama do meu espírito aguerrido
Sim, mortais, pecadores, mas gloriosos!

Uma vida trivial, que lástima
Mísero aquele que julga as vossas causas
Pobres ineptos de vidas inglórias!
Nunca entrarão para as folhas da eternidade
Nem para os corações de seus partidários
Nunca terão seguidores ou admiração
Que miséria não desejar tais feitos.

Hasta La Victoria, siempre
!
Proclamaram os corajosos.

terça-feira, 12 de outubro de 2010


         "Santo Antônio, certa vez, escreveu sobre quando foi para o deserto fazer um retiro de silêncio e foi acometido por todo tipo de visão - tanto demônios quanto anjos. Disse que, em sua solidão, algumas vezes encontrou demônios que pareciam anjos, e outras vezes encontrou anjos que pareciam demônios. Quando lhe perguntaram como ele sabia a diferença, o santo respondeu que só se pode dizer quem é quem com base na sensação que se tem depois que a criatura foi embora. Se você ficar arrasado, disse ele, então foi um demônio que veio visitá-lo. Se você se sentir mais leve, foi um anjo".

Elizabeth Gilbert 

O sal


Para que adoçar a vida? A felicidade não é doce, nunca foi, nem mesmo o amor possui um mínimo de sabor. Mas o caminho sim tem gosto, mesmo que de desgosto, a tristeza no rosto é a expressão do mal, a lágrima e seu precioso sal. A importância aos momentos tristes tem que ser dada, então, logo a solução para os problemas será revelada e a repetição deles estará condenada. O sal te abrirá os olhos e fará perceber que a felicidade vem depois, faça-a acontecer. Tomamos como exemplo os povos antigos que na tristeza da falta de ouro, fizeram-se felizes tendo o sal como tesouro. Extraia-o de todos os momentos difíceis,  não apenas torça, mas acrescente o suor da sua força, misture, coloque pra secar e tijolos terá, construa sua fortaleza, seja para defesa ou para atacar.

(05/10/2010)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

A resposta pode estar em seu sonho


Durante quase todas as noites enquanto você dorme, seu cérebro, ou sua mente – como preferir – elabora estórias com enredos supostamente desconexos e, de significado desconhecido. O homem que tivesse o poder de interpretar-los – entenda esse “interpretar” como algo totalmente diferente daquele escrito em revistas de R$1,99 ou daquele proveniente das operadoras de bola de cristal – seria a pessoa de maior sucesso e felicidade do mundo. 
Qual o objetivo do sonho? Como se deve interpretar um sonho? Por que tenho um sonho que me acompanha há tantos anos? Se estiver pensando que responderei a essas questões de maneira científica ou fiel a algum estudo, está enganado. Quero apenas que você entenda que os sonhos – mesmo parecendo imagens jogadas ao léu pela sua inconsciência – são as soluções das questões de sua vida. Eles refletem o que te preocupou no trabalho ou na faculdade, o que te causou um trauma no mês passado, a realização ou revelação de um desejo, ou simplesmente a lembrança de algum momento vivido com intensidade.
A resposta do porquê de não sabermos interpretar exatamente ou, lembrar, algo que saiu da nossa própria cabeça, é intrigante e desconhecida. Desconcertante também é refletir a razão deles acontecerem enquanto dormimos, afinal, é para todo o nosso corpo estar descansando. É em meio a todas essas questões que sou obrigado a perceber que muito fácil seria se tivéssemos de forma clara as respostas em nossos sonhos. Os seres humanos não viveriam, apenas se preocupariam em colocar em prática as soluções descobertas nos braços de Morfeu, não teríamos mais medo e por consequência não mais valorizaríamos a confiança, nem mesmo o amor, elementos fundamentais e característicos das nossas relações sociais.
Contudo, há quem consiga – em raros momentos de excepcionalidade, por intervenção divina, ou bondade do deus grego do sono – interpretar algumas de suas “obras”. Quantos relatos existem na bíblia ou na torá, de pessoas que através dos seus sonhos tiveram visões que mudaram a história. Jacó, Daniel, São José, São Patrício, bastou terem a capacidade de após acordar transformar o que era visão em conclusão, e assim chegar a uma solução. Para citar exemplos mais recentes, René Descartes, que em viagem à Alemanha teve uma visão em sonho de um novo sistema matemático e científico, já Friedrich August Kekulé von Stradonitz propôs a fórmula hexagonal do benzeno após sonhar com uma cobra que mordia sua própria cauda.
A interpretação da maioria das pessoas pode ainda não ser a tão aclamada solução, porém, servirá para forçá-los a pensarem melhor em alguma coisa errada que cometeram; para desenvolverem um poder premonitório e assim criarem uma defesa; ou, para fazer com que valorizem ainda mais alguma chance ou pessoa perdida durante algumas horas de sono.
Aprenda que o sonho, independente de ser bom ou ruim, bonito ou feio, inexplicável ou simples, não é apenas um tráfego de informações. Ele é a mais pura manifestação do seu subconsciente, ou até mesmo do próprio consciente, porque não? É uma experiência de imaginação que tem por fim a razão, somente a razão, e ocorre em um momento onde nada pode interferir, só Deus. Trabalhe seus sonhos, eles irão te ajudar a resolver os problemas da vida real e a definir sua personalidade.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O jogo do otimismo


         Por vezes já deixei o pessimismo ser abundante dentro de mim, era meu escudo. Minha tese sempre foi a de que se sempre esperarmos o pior, no final o que vier será lucro. Mas a pouco descobri um jogo novo, aquele que nos textos e nas palavras é tão bonito e, que possui apenas uma regra: sempre procurar ver o lado bom das coisas, não importando a situação. Como alguns de vocês já devem ter percebido alguma vez, o manual deste jogo vem acompanhado de dramáticas parábolas onde o personagem principal sofre um mal absurdo e, mesmo assim em meio a isso, não se esquece de encontrar algo positivo. Meu pessimismo está melhorando em passos largos, no entanto, temos que tomar cuidado para não chegar ao ponto de encontrar beleza nos elos da corrente que nos enforca.

domingo, 29 de agosto de 2010

Breve comentário sobre os princípios da natureza humana


          Na manhã de uma segunda-feira, na Faculdade, durante o intervalo de aula, a maioria dos alunos estava fora da sala. Este jovem que vos escreve interessadamente terminava uma leitura sobre sociabilidade, contrato social, e as diferentes teorias que tentam explicar a razão pela qual o homem se relaciona com outros indivíduos, enfim. No outro lado da sala, oito ou sete pessoas em torno de um jogo de cartas, e de repente todas ao mesmo tempo sorriram por algum motivo. Interagiam entre si através de alguns breves e oportunos comentários, e pequenos cartões com símbolos. 

          Aquela reação em conjunto me soou tão natural, foi então que meu raciocínio se esclareceu e tomou como verdade os estudos de Aristóteles e Santo Tomás de Aquino, onde consideravam que o homem é naturalmente sociável, a própria natureza humana induz o indivíduo a associar-se com outros e a se organizarem. Ao contrário do que pensava Platão. Mas ao mesmo tempo também me veio o questionamento: O homem por sua natureza é um ser mau, como defende Thomas Hobbes, ou, um ser bom, como afirma Jean-Jacques Rousseau? Ainda não sei, nem tenho uma opinião precoce para apresentar, porém, entre as diversas divergências existentes na comparação entre as teorias desses dois filósofos, concordo com Rousseau quando este diz que o homem tem como natureza ser livre, e não anti-social como explica Hobbes.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Fantasmas da Consciência





 O Fantasma
"Sou o sonho de tua esperança,
  Tua febre que nunca descansa,
  O delírio que te há de matar!..."
(AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos, 1853.)

         Existem fantasmas na minha e na sua consciência. Tristes e felizes, que nunca deixarão de te assombrar, não importa o arrependimento, as mudanças, nem mesmo o tempo. Todo homem que lutou, amou, machucou ou simplesmente foi feliz de verdade por algum momento, terá de conviver para sempre com a presença das consequências dos erros, das vitórias, da falta, do conhecimento de algo que te fez bem, mas que você não mais o tem. Novos fantasmas ainda virão, a questão é: quanto mais a sua cabeça poderá aguentar?

sábado, 6 de março de 2010

A arte do engano



Você acha que está tudo bem
Mas nunca esteve.
Você acha que conseguiu
Mas as tentativas foram todas falhas.
Você acha o que faz correto
Mas está tudo errado.
Você tenta ser bom
Mas o bom é ruim.
Você acredita
Mas a fé não é recíproca.
Você ama
Mas não existe amor.
Você pensa que tudo mudou
Mas a mudança nunca aconteceu. 
Você acha que está feliz
Mas a felicidade nunca dura mais que um sorriso.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Black Sky

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-Qual a cor do céu em inglês?
 Perguntou a  professora de doce expressão ao mesmo tempo em que levantava seu braço direito com um lápis na mão, numa tentativa de envolver os pequenos alunos em sua aula.
-Blue! Blue! Blue! Blue! 
Exclamavam em voz alta, todas as crianças com os braços ao alto. Sorriu a jovem mestre, pelo acerto unânime da classe.
-Black.. 
Sussurrou o único aluno que não tinha se manifestado instantes antes. Todos, inclusive a professora que mudara de expressão, desviaram seu olhares de quem julga para o canto direito da sala, especificamente ao garotinho sério de óculos redondos que sentava ao lado da grande janela, com um olhar despreocupado aos outros que ali estavam, mas que atravessava com vigor aqueles vidros sujos para admirar o céu de nuvens que realmente era azul e nada de preto tinha. De repente é disparado  o escandaloso sinal sonoro que alertava o fim da aula, quebrando a situação que tinha sido criada.
      A resposta "Black" não estava errada, durante a noite o céu realmente se torna escuro.  A imagem de céu mais representativa para o “garotinho sério de óculos redondos” não era aquele do azul ensolarado e com nuvens que a maioria das pessoas tem, sejam elas crianças de sua idade ou adultos maduros. Ele já entendia que todos preferiam o “Blue”, pois o céu do dia é mais simples, fácil e de forma nenhuma parece misterioso ou estranho, é apenas uma bela paisagem de tons claros e agradáveis. O seu céu mais interessante e mais real era o preto, com lua, estrelas e até mesmo estrelas cadentes que ele sabia que existia, mas que ainda não tinha visto. Toda noite antes de dormir, pela janela aberta do seu quarto, sentia o mistério do céu preto, e nesse momento ele se tornava grande, pequena era a noite para todos os seus pensamentos, a cada astro uma pergunta, não era para menos, afinal era um choque entre uma criança e o temido universo, que ocorria diariamente naquele travesseiro. Aquele escuro o atraía e enchia sua cabeça de dúvidas, ainda assim o menino tinha uma certeza, que por trás do brilho de cada estrela havia uma resposta.
      Anos depois aquele garoto tinha realizado seu sonho duplo, se tornou astronauta e viajou de verdade pelo espaço. Quando estava lá em cima fez questão de tirar uma fotografia em especial. Após voltar, a primeira coisa que fez foi enviar uma carta a sua antiga professora de inglês. A professora, hoje velha, mas de boa memória, quando recebeu a carta em mãos não lembrou de maneira alguma do remetente, assim abriu o envelope e achou uma grande foto na qual se via o planeta Terra bem pequeno e azul, e ao fundo ocupando quase que toda a foto  estava o preto do espaço, no verso da foto tinha os dizeres: “Querida professora, como a senhora pode perceber nesta imagem, o céu só é azul ao redor da Terra, mas em todo o infinito do universo ele é preto”. Ela então se lembrou do garotinho que foi seu aluno há muitos anos atrás, que respondeu “black” e que sentava ao lado da janela. Mais que isso, ela entendeu que enquanto a maioria das pessoas só consegue enxergar até onde seus olhos alcançam, outras vêem além, além do azul do céu. Lágrimas escorreram pela face daquela senhora ao mesmo tempo em que suspirava, deixou cair a fotografia, o experiente coração já não mais batia. Nesse mesmo momento o garotinho, hoje um adulto excepcional, estava deitado na sua cama e olhando o céu, como fazia todas as noites desde muito pequeno e de repente espantou-se ao ver pela primeira vez uma estrela cadente, que irradiava o preto daquela noite com a luz de sua cauda de fogo, então, na mesma hora que apreciava aquele momento tão esperado, com fé fez um pedido, e como um milagre o brilho dos olhos da sua antiga professora tinha voltado, junto com o pulso do seu coração.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

A crise de percepção

Por Eugenio Mussak

      Tive uma experiência única. Passei um fim de semana no Pantanal com Fritjof Capra, o físico austríaco que mora em Berkeley e que escreveu O Tao da Física e outros livros que estão entre os mais influentes dos últimos 30 anos.

  Falamos sobre ecologia, sustentabilidade, Obama e, claro, sobre o papel dos líderes. Subimos de barco um trecho do Rio Cuiabá e vimos jacarés tomando sol, tuiuiús e... garrafas pet boiando. Então começamos a falar sobre o fato de que as cenas degradantes — como a sujeira, a violência, a corrupção e a incompetência —, quando se banalizam, provocam uma espécie de cegueira coletiva, um déficit de percepção sobre elas mesmas. Para que não nos façam mal, fingimos que não vemos, pois a mente tem uma defesa para manter sua integridade.

"Olhar o futuro com clareza significa não usar os óculos da ilusão"

      Nietzsche, por exemplo, nunca negava a realidade, e acabou louco. Mas os líderes não podem fazer de conta que não há problemas e que o mundo é cor-de-rosa. Não precisam enlouquecer por causa disso, mas devem encará-los de frente e propor soluções. Só que não é o que acontece em muitas ocasiões. A verdadeira crise, disse-me Capra, é a crise de percepção. Muitos líderes não percebem, ou fazem de conta que não percebem, quais são os verdadeiros problemas de nosso tempo.

      A solução para a maioria deles é simples, mas requer uma mudança de foco. E isso é difícil porque significaria sair da zona de conforto, e a maioria das pessoas não tem essa disposição. A crise de percepção se manifesta pela dificuldade que a maioria das pessoas tem de “conectar os pontos”, ou seja, estabelecer correlação entre os problemas e suas causas, e também entre os diversos fatores que interferem nos resultados que desejamos.

      Estamos em uma crise da economia, sim, mas é bem possível que ela pudesse ter sido evitada se não fosse precedida pela crise de percepção que assola a humanidade. Olhar o futuro com os olhos da esperança significa não usar os óculos da ilusão, e sim as lunetas da razão.


Texto publicado sob licença da revista Você s/a, Editora Abril.
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quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Sem ar



     O que fazer quando se sentir sufocado? Sem ar, mesmo que com uma máscara de oxigênio? O suor e a ausência de vontades viram seus melhores amigos, ‘amigos’ seria uma palavra um pouco incomum nesse contexto. Tudo em volta o faz mergulhar com toda sua força, que logo em seguida não existirá mais, em um estado de entorpecimento mental, mesmo assim sendo, o uso do pensamento continua operante ainda que paralelamente inoperante aos olhos dos conhecedores do normal.

      Para os que curtem cinema, essa situação ou quem sabe, essa forma de viver, pode se assemelhar ao “estado matrix”, que é aquele existente em outra dimensão, onde seus habitantes tornam-se participantes de outro plano. E para os que se drogam, não estou falando das “viagens” causadas por substâncias alucinógenas.

      O motor que o faz interagir com as coisas reais, físicas e agir como mais um entre tantos está com defeito, mas as engrenagens de sua mente continuam rodando. Você quer liberdade, mas ela parece ser tão vazia, tão ampla, ou você consegue me dar um exemplo de liberdade concreta em 10 segundos? Se você conseguiu, reavalie seus conceitos sobre este tema, e se não conseguiu é porque já entendeu que essa idéia só existe naquelas cenas de finais de histórias onde os personagens felizes correm por entre um interminável jardim natural em cima de uma montanha, cheio de flores coloridas e vivas que soltam suas pétalas e folhas no bailar do vento quando esses personagens passam cantarolando.

      O estímulo para a entrada de ar seria uma nova forma de viver, na qual você pudesse ser de verdade, jogar ao fogo aquele cardápio pessoal que carregamos na consciência e que contém os tipos superficiais que devemos ser, em cada ambiente e com cada pessoa, além dos estereótipos que usaremos para classificar tudo ao nosso redor no longo de nossas vidas. A minha raça, não sobreviveria sem oxigênio, pois não conseguem respirar de maneira saudável outra coisa, mesmo assim, não me espanta o fato de que aos poucos necessito cada vez menos desse gás. O problema é que ainda preciso respirar para sobreviver, então a solução seria achar outros gases, mas esses outros gases só terminarão com meu sufoco no momento que começarem a existir, e para existirem será preciso trazer a realidade tudo o que penso e tudo o que quero, mas penso muito ou penso nada, quero muito e começo tudo, mas acabo não terminando nada, culpa dos padrões, que são sem graça, nos retraem e fazem meu nível de vontade alternar entre 0 e 0,1 .